Um intercâmbio para a vida toda


Thiago Monteiro (Till)
Camp Greenville - Overnight
USA: South Carolina - 2011
E-mail: thiagohmontheiro@gmail.com
Blog: www.a200m.blogspot.com


Os trens quando acontecem no susto parecem mais marcantes. Caí de gaiato no navio do ICCP: encontrei por acaso a Counselor Pricas comendo um insosso almoço no bandex, fiquei sabendo da tal da entrevista que era 0800 e fui ‘por-ir’ numa preguiçosa - e brutalmente quente - manhã de sábado onde encontrei, também por acaso, um bom amigo de longa data que me empolgou a tentar o programa – muito embora, esse mesmo amigo tenha desistido dois meetings depois... ironias da vida.

Analisei. Bom, era uma forma barata de viajar pra fora do país, se eu tivesse que trabalhar nem que fosse limpando o chão pra aproveitar depois, tava valendo! Sobretudo porque tinha acabado de perder um intercâmbio pela faculdade. Num primeiro momento, achei que pagaria caro demais pelo ICCP. E não digo em termos de dinheiro, pois o preço era até bem baixo. O problema foi outro: Achei, de cara, o povo todo retardado!

Musiquinhas bestas, atitudes infantis, jogos... é, na verdade, dos jogos eu até que gostava. Sem contar a preguiça de sacrificar todos os fins de semana por metade de um ano inteiro. E mais pra frente quando descobri que além dos fins de semana eu teria que dedicar mais tempo ao longo da semana preparando-me para “coisas” como Recreation e Contest? Ah, nem! É coisa demais... mas já paguei a inscrição e a primeira parcela, né? Vamos tentar pelo menos esse mês. Mas não é que duas semanas depois eu estava totalmente submergido nisso? O que ocorreu foi um evento contrário: por gosto, eu dediquei mais tempo do que precisava, achava os dias da semana longos demais e os sábados e domingos mais curtos que o habitual.

Com duas semanas de ICCP, esqueci-me totalmente que se tratava de um processo seletivo. Eu pagava por uma terapia, uma válvula de escape num semestre em que fazia dois estágios, monografia e matérias da facul. Em cinco anos de faculdade eu não fiz amizades tão fortes como em 6 meses do treinamento. Sim, treinamento que existiu durante todo o tempo e foi bastante efetivo! E descobri: não era nada chato. Em pouco tempo eu era tão “retardado” quanto qualquer um que me recebeu no dia da entrevista! Tive aqui “um plus a mais”.

Poderia tecer linhas e linhas sobre todos os eventos que fizeram diferenças estatisticamente significativas em minha vida durante todas as três etapas, mas pra não dar spoiler, me restrinjo às impressões e mudanças iniciais e aos finalmentes. Depois de 6 meses despenquei num camp novo, onde outrora apenas o YEP (Youth Exchange Program) pisara. Ê nervosismo que batia! Eu não tinha nada de experiências anteriores pra me basear. Teria que descobrir as manhas e as manhãs por mim mesmo. Nada de dicas específicas ou macetes. As informações dadas pela counselor que acompanhou o YEP não foram tão esclarecedoras uma vez que a rotina de um camp counselor e de um counselor do YEP são diferentes.


Viajei com uma das pessoas mais incríveis que já conheci e hoje sei que é um dos meus melhores amigos, quiçá um irmão honorário! André e eu passamos alguns perrengues iniciais - coisas que duram boas e engraçadas histórias, como por exemplo, como usar um cartão telefônico, o suco de tomate, os café e chocolate incandescentes no aeroporto, a perda do voo, a ligação nem um pouco comunicativa pro camp, os banhos gelados, a noite 0°C, e outras coisas que aconteceram apenas nas primeiras 24 horas juntos. Convivemos bem e consolidamos uma amizade que torço que dure muito, muito mesmo! Conheci também outros brasileiros incríveis que foram pelo YEP, dentre eles a Kelinha, Counselor do grupo, que se tornou um outro achado pra mim! Uma amiga e tanto.

Ah, Greenville... O acampamento era incrível! No alto de montanhas, me lembrava muito a Serra do Cipó e outros lugares de Minas! Tava me sentindo em casa. Não era muito quente – o que pra mim era ótimo, pois não gosto de calor –, tinha muita cachoeira perto, muitas árvores diferentes, insetos também – não me julguem, não sou botânico ou zoólogo, mas biólogo é tudo besta mesmo – trilhas bastante bonitas, atividades voltadas para educação ambiental, aventura, natureza... Era maravilhoso! E a capela desse lugar? Nossa, é um dos lugares mais incríveis e do qual mais sinto falta. É surreal e cheio de paz, mesmo para quem não for religioso ou até mesmo ateu. Ela foi construída num topo de montanha, com as colunas feitas de pedra e um telhado de madeira. Bem rústico. O diferencial é: não há paredes! E por essa razão a vista é exuberante. Atrás do altar enxerga-se uma vasta reserva florestal e, à noite, ao longe, as luzes de cidades mais distantes e estrelas no alto. Não é a toa que o nome da capela é Pretty Place!

Lá também descobri que aprender inglês é fora do país mesmo viu. Na Carolina do Sul/do Norte (o camp fica na divisa) as pessoas são extremamente pacientes com estrangeiros. Todos falam devagar, não têm aqueles sotaques carregados e só te corrigem se você pedir para ser corrigido. O povo é bastante educado, sem contar que possuem o melhor sorvete do universo! Ah, que vontade de ir ao Dolly’s em Brevard nos Time Off’s!

 At camp, superei limites físicos que me impunha, psicológicos que nem sabia que tinha e até fobias - de forma parcial, no caso de ofídios. Fiz coisas que jamais pensei que faria em minha vida, como ir para lagos na função de salva vidas, atirar com arco e flecha, fazer tirolesa, escalar paredão, remar em canoa, vender “pencils” (cenas de capítulos posteriores). Aprendi a me virar, a ser independente, a ter que resolver sozinho meus problemas ou recorrer humildemente a quem pudesse me ajudar... Vi que americanos são tão seres humanos quanto brasileiros e que life is short, baby.

Sair do camp foi difícil. Deu um pouco de crise de Mogli - pra quem não leu o ‘Livro da Selva’, Mogli, que cresceu na selva, é levado para a aldeia de homens onde não se adapta e foge. De volta à selva, percebe que mudou durante a estada na aldeia e sente que não pertencia mais à selva como antes -. Tinha medo de voltar a ‘civilização’ e até mesmo ao Brasil, por mais saudades que estava sentindo. A motivação de sair é que ajudou: as famosas e divertidas viagens pós camp!

São satisfações bastantes específicas, difíceis de se partilhar, de se fazer entender ao mesmo tempo e da forma como queremos. É exatamente o que você viveu, é genuinamente seu. Satisfiz minha criança interior que tanto me aporrinhou pra conhecer os parques da Disney, passeei quatro vezes na montanha russa do Aerosmith, rachei de rir nos Simpsons do parque da Universal, me senti inserido em Hogwarts, dei uma passada num outlet em Miami, subi ao Empire State onde admirei uma das vistas mais incríveis de todas que já vi - não sei explicar porque, mas NY tem um “trem” e subir ao Empire fez toda a diferença pra eu curtir mais ainda a cidade -, dormi pouco e comi no maximo duas vezes por dia - para, respectivamente, o dia e a grana renderem mais - e aproveitei até o último segundo! Inclusive o pouso forçado em Porto Rico pra prenderem um cara que destratou a aeromoça.

Abraçar mamãe e papai, comer um arrozinho com feijão, postar as fotos no facebook... tudo tem mais gosto. Quando a gente volta, tudo é boa história pra se contar, tudo é experiência e, ao contrário do que muitos pensam, nossas mentes são otimistas, pois as memórias ruins são apagadas e tudo é Panis et circenses. Nos restam as lembranças, as fotos, a saudade e o saudosismo.

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